“Chico – Artista Brasileiro”, magistral filme de Miguel Faria Jr.
“Chico – Artista Brasileiro”, documentário de Miguel
Faria Jr. com certeza vai para o Olimpo do cinema brasileiro. O Chico que o
diretor exibe é engraçado, gozador, leve, intenso, banhado de bom humor e nem
de longe parece um senhor que vai fazer 72 anos em junho deste ano.
O filme é simples como Chico, grandioso, elegante,
travesso como Chico, um dos maiores talentos da história cultural do Brasil. É
preciso dizer isso. Sim, é preciso dizer porque acho tola qualquer visão
reducionista de pessoas múltiplas e geniais como Chico Buarque de Holanda.
Susana Schild, uma das maiores e mais consistentes
críticas de cinema do Brasil, escreveu no Globo: “Chico - Artista Brasileiro”
propicia um encontro privilegiado com um artista visto por ele mesmo na
maturidade. Levando em conta a extensão, diversidade e genialidade da sua obra
e o grau de intimidade obtido por Miguel Faria Jr., não há como deixar de
aplaudir de pé.”
Luiz Fernando Vianna, Folha de S. Paulo – “Ganha-se a
inteligência e o humor de Chico, ótimo contador de causos e privilegiado
conhecedor da própria vida. Mas não se abrem muitas portas para surpresas ou
assuntos incômodos, pois é ele quem está com a chave da narrativa.”
Raphael Camacho, Cinepop – “O filme foge de qualquer
tipo de polêmica. É quase uma conversa de bar entre amigos. A naturalidade com
que Chico vai contando suas histórias aproxima muito o público de cada
sequência[...]”
O Chico Buarque que vi e ouvi na tela é idêntico ao que
acidentalmente conheci em 1978, ano de “Cálice”. Eu era repórter da Rádio
Jornal do Brasil e fui pautado para entrevistá-lo, o que aconteceu meio na
correria, na hora do almoço. Na correria porque ele ia pegar um avião para São Paulo
e, por isso, sugeriu que a entrevista fosse concluída no percurso entre onde
estávamos (Botafogo) e o aeroporto Santos Dumont. Topei.
Descemos e ele entrou no carro, uma Brasília branca. Chico
dirigia mal, muito mal, falava pra cacete (eu com o microfone perto da boca
dele, que cena) mas conseguimos chegar ilesos no aeroporto onde o mulherio
ficou em cólicas diante do ídolo.
Sinceramente achei que elas iriam estupra-lo
ali mesmo, houve até um certo empurra empurra. Foi quando Chico me pegou pelo
braço e me perguntou “dá pra ficar na área até a hora do embarque?”. Claro.
Ficamos tomando café, sempre vinham fãs, pediam autógrafos e a entrevista
seguiu até o final. Ficou legal porque o tal Chico Buarque que eu achava
caladão, monossilábico, não existe; o filme mostra bem isso.
Acabamos o café, ele já se preparava para embarcar
quando perguntou “você se incomoda de pegar meu carro e levar para o
estacionamento do Jornal do Brasil? Quando eu voltar dou um jeito de mandar
buscar lá.” Me deu um chaveiro e perguntei “os documentos estão no porta luvas?,
ele respondeu “acho que estão” com jeito de “não estão, meu chapa”, mas tudo
bem, levei o carro sem problemas.
Uns meses depois ele veio assistir Marieta Severo no
Teatro Municipal de Niterói, noite de sábado.
Também fui assistir e no
intervalo encontrei com ele no hall principal. Ele estava sozinho, meio
deslocado, me aproximei ele lembrou e logo perguntou “onde tem um cafezinho por
aí?”. Fomos andando até a estação das barcas onde funcionava o bar Snoopy, um
muquifo sensacional que reunia a boemia pesada. Chico virou dois cafezinhos e
acendeu um cigarro.
Ao longe, noite estrelada, um balão lanternado gigante
voava em direção ao mar e Chico comentou “Niterói tem muito balão, né”,
expliquei que o padroeiro é São João já com uma ideia de leva-lo até o Fonseca
onde eu conhecia uns baloeiros que certamente deviam estar mandando obras
primas para os ares.
Foi quando uma Kombi que transportava jornais começou a
pegar fogo junto ao meio fio. Tumulto, confusão, Chico assuntando, eu também e,
de repente, ele falou “vamos voltar para o teatro, quero buscar a Marieta”.
Voltamos, ele entrou no teatro, disse “valeu mesmo, nos vemos por aí” e foi
isso.
Não tive outros encontros informais com ele, só as raríssimas
e caretaças entrevistas coletivas ao longo dos anos. “Chico – Artista Brasileiro”
mostra esse Chico Buarque que, por poucos mas preciosos minutos, tive o
privilégio de conhecer.
Grande filme!
Grande Chico!
Comentários
Postar um comentário
Opinião não é palavrão. A sua é fundamental para este blog.
A Comunicação é uma via de mão dupla.