Houve
um tempo em que saíamos de casa sem saber se íamos voltar. Tempos
de violência urbana. O tempo passou, o Estado do Rio elegeu uma
constelação de medíocres (e safados) e isso aqui virou
guerra civil. Agora não sabemos, sequer, se vamos conseguir sair, o que dirá voltar. Os governantes assaltaram os cofres
públicos até o talo e decretaram um oportunista “estado de
calamidade pública”.
Ontem
um americano foi assaltado em Ipanema. O bandido levou tudo e, não
satisfeito, deu quatro tiros de pistola nove milímetros na vítima.
Não acertou nenhum e ainda levou uma surra do americano. Na delegacia a
vítima voltou a ver o bandido, teve um ataque de fúria e, pasme,
foi preso. Sim, no Rio o turista leva quatro tiros e acaba em cana.
Só rindo. O americano volta amanhã para Nova Iorque jurando nunca
mais pisar aqui. Culpa dele? Não sabia que a “cidade maravilhosa”
caminha para ser um novo Afeganistão, com todo o respeito que tenho pelo Afeganistão?
No
rastro do emporcalhamento político administrativo do Rio, muitas
empresas alegam “é a crise...” (sempre ela) e investem no que há
de pior (e mais barato) em mão de obra desqualificada, o que garante
uma boa alavancada nos lucros.
É
quando a vítima, já farto do estelionato político, resolve
espairecer, quem sabe pegar um cineminha. Tudo bem. Entra no carro
(tem que ser um modelo popular para não atrair o verdadeiro mandante, a bandidagem), paga quase 15 reais de estacionamento no
cinema (se deixar na rua perde o carro, ou metem uma arma na cabeça
dele) e compra o ingresso (R$ 31,00), apesar da sala de espera estar
quente porque parece que o ar condicionado não está funcionando
direito (mentira, é economia de luz).
Próxima
etapa: comprar um saco médio de pipoca e uma garrafinha de água
mineral pequena: R$ 15,00. Entra na fila, espera, espera, espera,
chega a sua vez. Pega a pipoca, a água e caminha para a entrada do
cinema onde um funcionário diz que o sistema de projeção pifou.
Podiam
ter avisado antes? Sim. Mas sabem como é a incompetência. Antes de ir para a roubada a vítima tentava falar com o cinema por telefone, mas ninguém
atendia. Podiam ter avisado na bilheteria? Podiam. Ou, quem sabe, lá
fora no estacionamento para a vítima não morrer em R$ 12,00.
Afinal, vivemos um tempo de fartura tecnológica. O sujeito peida
aqui e sentem o fedor em Bangladesh.
O
pessoal do estacionamento explica (?) que devido aos assaltos agora
os clientes tem que pagar antes de entrar e não na saída. Consolo:
um rabisco no ingresso autorizando a entrada em outro dia, quando o
sistema provavelmente voltará funcionar. Ou, então, pegar o
dinheiro de volta, como determina o Código de Defesa do Consumidor.
A
vítima chega em casa, entra
na página do cinema no Facebook e reclama. Horas depois uma pessoa
sem nome que se identifica apenas
com o modernoso e pomposo título de “equipe
de comunicação de mídias sociais” diz
que “vamos apurar o ocorrido para lhe responder adequadamente”.
Ninguém assina. E
ninguém diz nada um dia depois.
Dia
seguinte. Apesar de ter percebido que entrou em festa de vara fantasiada de bunda a insistente
vítima
retorna
ao cinema com o ingresso rabiscado. Fila na entrada da sala. Quando
chega a sua vez, o porteiro (na verdade peão do gado bípede), mal humorado
diz “tem que pegar a autorização na bilheteria” e
desconsidera o rabisco.
A vítima caminha até a bilheteria, consegue validar o ingresso e
finalmente entra no cinema...onde está sente um pouco de calor,
provavelmente porque o ar condicionado está com problemas (mentira,
é economia de luz – 2 -.) Parece até prefeitura.
Por
isso é melhor ficar em casa e assistir Netflix, ou ir na casa de
amigos. Para começar, não há estresse. Depois, a economia. Nessa
odisseia descrita acima a vítima desembolsou, no total: consumo
de saúde – imensurável;
R$ 31,00 do ingresso, mais R$ 12,00 do estacionamento, mais R$ 15,00
da pipoca, mais R$7,00 da gasolina. Total?
R$ 65,00.
Um
mês de Netflix (isso mesmo, um mês!) custa em torno de R$ 20,00 com
um invejável cardápio de filmes e séries, sem estacionamento,
aporrinhação, gente mal humorada, ar condicionado “pifado”,
etc. Fora o Netflix, o sistema de aluguel de filmes do You Tube é
espetacular e está disponível para TVs com aceso a internet. Lá
você assiste, por exemplo “O Regresso” pagando R$ 10,00, por 24
horas, “Elvis & Nixon”, R$ 14,00, enfim, um gigantesco
catálogo de filmes.
Não
é só ir ao cinema que virou rali. Em qualquer grande casa de shows
no Rio paga-se em torno de R$ 100,00 para assistir pelo telão, já
que lá de trás não se enxerga (e ouve) nada. Mas quem quiser
desembolsar R$ 250,00 ou R$ 300,00 assiste lá na frente, onde muita gente fica batendo papo de costas para o artista no palco e teclando no whatsapp. Fora
estacionamento, gasolina, provável congestionamento.
É
por isso tudo que tirar as pessoas de casa em tempos de
“molambalização” dos caríssimos serviços está cada vez mais
difícil. E, diz a lenda, a tendência e piorar.