Let it Be, o filme
Um
dia desses assisti de novo ao filme “Let it Be”, dirigido
por Michael Lindsay-Hoog. Foi feito ao longo de janeiro de 1969 e
lançado em maio de 1970, quando a banda já havia acabado. Paul
McCartney foi o único que lutou para que o filme fosse feito (aliás,
era o único que ainda parecia acreditar que dava para
seguir em frente com o grupo), e o que era para ser o registro
histórico dos ensaios, momentos de composições, interiores do
maior grupo de rock de todos os tempos acabou se transformando num
testemunho vivo sobre o fim dos Beatles.
Não
há qualquer tipo de iluminação de cinema. Não há cenários,
o roteiro é mínimo, a falta de luz gera a sensação de má
qualidade das imagens, mas e daí? As câmeras circularam à vontade
entre os músicos no estúdio, registrando conversas,
gargalhadas e mal estar. George Harrison não esconde que
já está de saco cheio e em determinado momento, conversando com
McCartney, diz, desanimado e irritado “tudo bem. Diz o
que devo fazer e eu faço”, uma maneira nada sutil de falar
“dane-se”. Rindo Starr está apagado, desanimado e só
raramente (mas raramente mesmo) se diverte dividindo um piano com
George numa brincadeira ou se divertindo com a então pequena Stella
McCartney, de três anos.
Yoko
Ono é onipresente. Aparece em várias cenas, quieta, sorriso de
Monalisa, observando, sempre ao lado de Lennon, com quem chega a
dançar uma valsa no estúdio. O constrangimento no ambiente é óbvio
mas o som rolou assim mesmo. E que som. Que som! Com Billy Preston no
órgão, The Beatles, mesmo sabendo que era o fim, arrebentou.
Curiosamente,
o clima entre McCartney e Lennon não parecia ruim. Os dois se
divertem, riem quando dividem microfones, mas fica claro o
comedimento, a cerimônia. Em determinado momento comenta com ele que
se George Harrison não embarreirasse os Beatles deveriam voltar a
tocar ao vivo, quem sabe começando pelo Royal Albert Hall, em
Londres.
Há
quem diga que naquela época Lennon teria sugerido a Macca que
Harrison fosse substituído por Eric Clapton, o que foi negado. Paul
achava que The Beatles só deveria existir com os quatro. Há muito
mistério na atitude dos dois ao longo dos quase 90 minutos do
documentário, onde tocam de tudo, inclusive canções que, creio,
permaneceram inéditas. O final apoteótico foi aquele lendário show
no telhado da gravadora Apple que acabou com a chegada da polícia.
Assistir
Let it Be faz muito bem porque: 1 – comprova que The Beatles foram
(e são) muito mais gigantescos e monumentais do que supomos; 2 – o
grupo acabou na hora certa. Melhor do que seguir definhando
publicamente.