Jornalismo molambo

Foi em 2009 que resolveram acabar com a obrigatoriedade do diploma de curso superior para quem quisesse virar jornalista. Isso significa que, a partir daí, qualquer um pode se travestir de profissional da comunicação e sair cometendo matérias por aí, muitos sob a alcunha de “blogueiro”. Apuração? Para que se existe o Google? Que é tratado por eles como fonte de verdades absolutas e não ferramenta de busca.

O que sei é que algumas empresas sérias ainda exigem o diploma, mas, por outro lado, outras querem que se dane. Qualquer um entra, escreve o que quer e que se exploda a humanidade. Concordância? Estilo? Gramática?. Adereços. Um colega, na mesa de um bar mês passado, afirmou que da falta do filtro (curso superior) nasceu o jornalismo molambo que é mal apurado, mal escrito, irresponsável, ignorante, boçal, etc. 

O esbaforido colega diz que “esse filtro não tem nada a ver com a qualidade dos cursos que, sabemos, são uma merda, mas pela dificuldade de entrar na faculdade por causa de vestibular, Enem, o escambau. Isso inibia muita gente que decidia não militar mais em comunicação. Agora, entra qualquer um. Não digo que virou bordel porque bordel exige qualificação das profissionais.” Claro, falta ainda um ingrediente precioso que transbordou até o ano 2000: coleguismo. Nas redações, ninguém dedurava ninguém (crime hediondo), o carreirismo era considerado obra nefasta e o arrivismo condenava a morte. Hoje, em algumas redações, vale a lei "melhor do que um chefe só o próximo" e as delações, rasteiras, camas de gato parecem rotina.

O jornalismo molambo está na maioria das mídias. Lemos, ouvimos, assistimos a alguma barbaridades como, por exemplo, o uso da expressão “segue em...”. Explico. Um cantor popular hospitalizado, segundo a molambada “segue internado”. Como assim? Pior: “o trânsito segue parado na avenida Atlântica”.

Banhado de saudade (confesso), leio uma biografia que retrata um tempo especial do jornalismo brasileiro. O livro “Enquanto Houver Champanhe, Há Esperança: Uma Biografia de Zózimo Barrozo do Amaral “, escrito pelo grande colega Joaquim Ferreira dos Santos, uma viagem pela vida do colunista dos anos 60 aos 90, passando pelo entorno dele. Quando terminar a leitura publicarei aqui uma resenha.

Entre as características do jornalismo molambo, está também a mania de romancear as matérias. Exemplo. “Papa Francisco chega ao Rio”. Até recentemente havia a lei do lead e do sub lead. O jornalista abria a reportagem resumindo a história nas cinco primeiras linhas. Exemplo: “O Papa Francisco chegou ao Rio ontem as 10 da manhã. Do aeroporto pegou um helicóptero...”. O sub lead , com até 10 linhas, dava mais alguns detalhes a mais. Exemplo; “O Papa foi recebido por várias autoridades. O esquema de segurança...”. E depois dele, o corpo de matéria.

O jornalismo molambo acabou com o lead e com o sub lead. No lugar dele, em muitos casos, aparece a famigerada “romanceada”. Aproveitando o Papa, um exemplo: “A manhã estava linda no Rio. Temperatura seguia amena, trânsito seguiu tranquilo por causa do feriado decretado...”, e assim vai até a linha 20 quando, finalmente a matéria começa a falar do papa. Poucos leitores resistem e largam o jornal.

Essa romanceada era uma enrolação que Joaquim lembra em “Enquanto Houver Champanhe...” que os velhos jornalistas batizaram de “nariz de cera”. Ele conta:

O Diário Carioca era o melhor lugar para quem queria mexer com as teias de aranha do jornalismo. Chega de beletrismo! Chega de nariz de cera!, aquela ridícula abertura de texto que custava a entrar no assunto! Para se falar de um choque de automóveis na Rio Branco, antes se anunciava o crescimento vertiginoso da frota na cidade! Chega também de ponto de exclamação!! (...)”

Ou seja, hoje o jornalismo molambo utiliza recursos considerados velhos e decadentes no início dos anos 60. Fico imaginando se acabassem com a exigência do curso superior de medicina, ou de engenharia, o de f´sica nuclear, ou de...


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